Autor: Alberto Grimm [1]
Onde se Escondem os nossos Medos?
Talvez o medo só exista porque nos recusamos a examiná-lo de perto...
Definitivamente, aquela noite não era qualquer noite. Parecia mais escura que a mais escura daquelas já presenciada por ele, e também a mais fria, a mais silenciosa, assustadora, quieta demais. Nem grilo estava de plantão naquele dia, quer dizer noite. Olhou da porta antes de sair à rua, fechou os olhos para não distrair os ouvidos, em busca de algum barulho que quebrasse aquele silêncio quase absoluto, quase, porque os seus passos, estes, ele podia escutar.
A noite avançara depressa demais, tanto que só conseguiu dar-se conta da coisa, quando o homem do sino passou pela rua. Ele era bastante pontual. Seis horas, nove horas, dez, onze e meia noite. Tocava o sino e anunciava a hora correspondente. Depois, sumia tão misteriosamente quanto tinha aparecido. Parecia vir do nada e, simplesmente, se materializava para anunciar as horas. Numa mão uma lanterna a gás, na outra o sininho que parecia ecoar por toda cidade.
"Meia noite e o tempo está muito frio...", anunciou naquele momento.
Uma lua pálida e enorme parecia negar-se a caminhar pelo céu, pois, até onde lembrava, ela permanecia estática no mesmo lugar, como se estivesse magneticamente presa no fundo negro do espaço. O frio era intenso e o vento só piorava as coisas. Mesmo agasalhado tremia da cabeça aos pés. Apressou os passos em direção à sua casa, e mentalmente, começou a traçar o melhor caminho para chegar mais depressa.
Por onde passava poucas janelas ainda estavam iluminadas. Quase certo era que a maioria já tinha se recolhido. Uma neblina estática que mais parecia vapor congelado cobria boa parte das ruas, o que parecia sufocar a luz dos lampiões dos postes de iluminação pública. Lembrou das histórias de assombrações, das verdadeiras aberrações que escolhiam noites como aquela para perseguir os mais imprudentes. Sentiu um calafrio a lhe percorrer o corpo e apertou ainda mais seus passos.
Foi quando viu o estranho vulto numa esquina próxima, no meio do trajeto por onde iria passar. Parou e ficou a observar aquela singular figura negra por um instante. Estava ele imóvel, bem abaixo da escassa luz do poste, e parecia olhar na sua direção. Vestia uma longa capa negra de gola alta, no alto da cabeça uma cartola, e na mão esquerda segurava uma longa bengala, mas estava longe demais para que pudesse vislumbrar seu rosto. E em seus pensamentos, naquele momento, nenhuma coisa positiva se fazia presente.
Pensou em ir para o outro lado da rua, para a outra calçada, ou mesmo em dar meia volta e retornar. Mas isso seria um vexame, caso o estranho não fosse nada daquilo que ele estava pensando. Na dúvida, parou de caminhar. Ficou ali, parado, observando o misterioso vulto, assim como este, também parecia olhar em sua direção. Não seria nada demais correr e se afastar dali, afinal, quem tinha os motivos para isso era ele. Medo é medo, e prudência em excesso não faz mal a ninguém.
Mas, e se o estranho, ao perceber sua manobra evasiva, corresse atrás? Como desejou que o homem das horas aparecesse outra vez, mas sabia que isso não mais seria possível naquela noite. Àquela hora já devia estar dormindo, afinal de contas já cumprira sua missão naquele período. Lembrou das palavras que sua mãe dissera: "É um perigo para as pessoas que andam tarde da noite pelas ruas do centro. Dizem que por lá, depois da meia noite, perambula pelas ruas desertas, um temível Vampiro, faminto, em busca de vitimas desavisadas...".
Sentiu um nó na garganta e um desconforto à boca do estômago. E, naquele frio de congelar, começou a suar frio. Não sabia o que fazer. Procurou em sua sacola alguma coisa que pudesse usar como arma."Talvez", pensou, "ao me ver mexer na sacola, ele ache que possuo uma arma e pense duas vezes, desistindo de me atacar.". Procurou posicionar-se sob a parte mais iluminada do ponto onde se encontrava, para que o esranho o pudesse ver claramente, e despejou no chão todo conteúdo do seu alforje.
Fingiu que procurava com disposição alguma coisa em meio aos objetos, isso, decerto, teria algum efeito psicológico sobre o incógnito personagem e suas intenções. Distraído como estava, só percebeu que a misteriosa sombra, aparentemente humana, havia desaparecido, ao erguer novamente os olhos. Apavorado olhou à sua volta. Correu para o meio da rua de onde teria uma melhor visão de toda a área.
Mas, não o viu. Será que seu plano dera certo? Era a única e mais lógica explicação que tinha naquele momento. Sentiu-se momentaneamente vitorioso e seguro. Mas, e se ele se escondera em um dos muitos becos, pelos quais ainda teria que passar até chegar em sua casa? Podia ser isso, afinal de contas, um Vampiro não é nenhum bobo, e pelo que se sabe, sempre ataca suas vítimas de surpresa.
Que vontade de gritar. Como estava arrependido de ter ficado até tão tarde na rua. E se ele se transformasse também em Vampiro depois de atacado? Sim, diziam que era assim, aqueles atacados pelos vampiros, se transformavam em Vampiros, zumbis, mortos vivos, parasitas que vagueiam sem rumo pelas noites de lua cheia, em busca de sangue, por toda eternidade. O que pensariam seus pais, especialmente sua mãe, ao ficar sabendo que seu filho, agora, era um Zumbi da meia noite?
Como achou forças para reagir nem ele sabe, mas, de repente, como se tivesse sido atingido por um raio de energia pura, saiu em desembalada carreira, só parando quando chegou à porta da sua casa. Sua mãe o aguardava ansiosa na sala. "Meu filho", ela exclamou alegre. "estava preocupada com sua demora..", e o abraçou.
"A senhora não sabe de nada. Acabo de escapar de um Vampiro de verdade lá no centro da cidade!", falou nos espaços entre uma tomada de fôlego e outra.
Então, lhe sorri docemente a mãe, e fala carinhosamente:
"Oh querido, onde já se viu. Já te disse dezenas de vezes e vou repetir agora uma vez mais. Vampiros não atacam Lagartixas, como nós, só pessoas. Por isso mesmo, não precisa temê-los outra vez...".
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