DIVERSIFICAÇÃO:
Brasil, a matriz elétrica do futuro.
O dilema que a sociedade brasileira enfrenta é a opção por mais reservatórios versus mais emissão de gases de efeito estufa. Vale assinalar que os novos reservatórios projetados pelo governo pretendem alagar menos quilômetros quadrados do que o desmatamento verificado na Floresta Amazônica em um ano. E as novas usinas hidrelétricas vão poder gerar - por mais de 50 anos - energia elétrica limpa, renovável e mais barata
Nivalde de Castro
Planeta Sustentável - 26/06/2013
Mário Leite
Nivalde de Castro é coordenador geral do Grupo de Estudo do Setor de Energia Elétrica (Gesel/UFRJ)
A questão energética ganhou importância estratégica mundial basicamente em função de duas variáveis. A primeira é oaquecimento global provocado pelas emissões de gases de efeito estufa derivadas em parte da produção de energia elétrica. A segunda variável é econômica: o custo dos insumos energéticos vinculados diretamente à instabilidade e aumento crescente do barril do petróleo nos mercados internacionais.
Nesse cenário energético mundial de incertezas que passou a marcar o século 21, a maioria dos países adotou políticas econômicas com o duplo objetivo de: (i) alterar as matrizes elétricas buscando garantir a segurança do suprimento, ou seja, ficarem menos dependentes das importações de gás e carvão, e (ii) investir em novas tecnologias de energias renováveisprincipalmente eólica e solar. Dessa forma, a nova política energética mundial busca reduzir as incertezas em relação aos custos e mitigação gradual dos impactos sobre o aquecimento global.
Antes do acidente de Fukushima em 2011, a energia nuclear era uma tendência forte e firme para superar as restrições ambientais e de custos da energia por parte dos países desenvolvidos e emergentes de grande porte como Índia, China e Rússia. As centrais nucleares apresentavam a dupla vantagem de não emitir gases de efeito estufa e permitir a segurança energética. O acidente de Fukushima paralisou em grande parte os investimentos na construção de novas centrais nucleares. E, a exemplo de Chernobyl, ocorrerá um lapso temporal até nova aceitação da opinião pública, vinculada a uma nova geração tecnológica mais segura e mais cara.
Afortunadamente, o Brasil não enfrenta esses dilemas e desafios da política energética mundial. A matriz elétrica brasileira apresenta uma estrutura de participação de fontes renováveis X não-renováveis inversa em relação à matriz mundial, pois cerca de 87 % da matriz nacional é de fontes renováveis, enquanto a matriz elétrica mundial detém somente 13% de participação de energias renováveis.
Além de deter o status de uma das melhores matrizes elétricas do mundo, o Brasil tem outro importante e competitivo diferencial em relação aos outros países: tem um imenso potencial de recursos energéticos renováveis e não renováveis. Dessa forma, o Brasil se depara, no campo energético, com o saudável "paradoxo da abundância", precisando definir uma política energética estratégia de ampliação da matriz que seja mais econômica e eficiente do ponto de vista da operação do sistema elétrico, já que o problema do aquecimento global e de importação de recursos energéticos não são problemas do Brasil.
Em busca da otimização da política energética brasileira, foi definido, de forma correta e consistente, priorizar a construção de centrais hidrelétricas promovendo o avanço da fronteira elétrica para a região da Amazônia, onde se encontra mais de 70% do potencial hidrelétrico do Brasil, estimado em 160 mil gigawatts, representando o terceiro maior potencial do mundo, só ficando abaixo da China e Rússia. Essa prioridade de construir hidrelétricas vem recebendo críticas de segmentos sociais, preocupados com os impactos ambientais e econômicos sobre as populações ribeirinhas. Essas críticas perdem fundamentação, pois o Brasil tem uma das legislações ambientais mais rigorosas do mundo, impondo e determinando que as construções das hidrelétricas sejam mais caras, em função das compensações para mitigar os impactos na flora e fauna, na recolocação das populações afetadas e em investimentos sociais em educação, saúde e saneamento que somam mais de 5% do custo total do empreendimento.
Além desses custos diretos, há os atrasos e postergações em razão das imposições legais por parte da Justiça e dos órgãos ambientais.
Um resultado da oposição ambiental às centrais hidrelétricas na Amazônia é que estão sendo construídas somente usinas sem reservatórios, do tipo fio de água. Essas usinas diminuem sensivelmente o impacto causado pelo alagamento das terras, mas apresentam como característica central produzir muita energia elétrica no período úmido (dezembro a maio), período das chuvas e das cheias dos rios. A energia excedente, ou seja, o volume de águas que sobra não pode ser represado e acumulado em reservatórios, determinando a perda de uma das vantagens centrais do sistema elétrico brasileiro que é o de ter energia (água) acumulada nos reservatórios para ser utilizada no período seco (maio-novembro). A perda da capacidade de regularização da demandade energia elétrica através dos reservatórios está diminuindo rapidamente a segurança de suprimento no período seco.
Como resultado desse processo de oposição às centrais hidrelétricas com reservatórios, o Brasil está tendo de diversificar a matriz elétrica em duas vertentes.
A primeira e positiva vertente de diversificação reforça o caráter renovável da matriz elétrica nacional por meio de investimentos em energia eólica e biomassa, em especial derivada do bagaço da cana, em que o Brasil tem também um grande potencial de 300 mil megawatts de eólica e 15 mil megawatts (para 2020). Essas fontes renováveis apresentam, no entanto, dois problemas. O primeiro é que apresentam custos mais elevados do que das grandes e médias centrais hidrelétricas. O segundo é de que por serem fontes de energia intermitente, não há garantias de que elas estarão sempre disponíveis quando necessárias, e a capacidade de previsão da sua geração é bem menor do que da hidreletricidade. Há, porém uma característica importante e positiva que é de serem complementares à geração hidrelétrica, pois elas produzem mais energia no período seco, quando não chove, permitindo economizar as águas dos reservatórios das hidrelétricas. Na energia solar o Brasil tem um potencial muito grande, pois é um país tropical e de dimensões continentais. Mas como é uma tecnologia ainda não totalmente desenvolvida, apresenta um custo muito alto para gerar eletricidade, não sendo ainda competitiva em relação às outras fontes.
A segunda vertente de diversificação da matriz impõe uma situação crítica e de oposição ao meio ambiente. Trata-se da necessidade de construir centrais térmicas para garantir segurança na geração de energia elétrica quando ocorrerem problemas de oferta de fontes renováveis, especialmente das hidrelétricas como está ocorrendo com a falta de chuvas em 2013. O problema é que com a restrição às usinas com reservatórios está necessidade de construir termelétricas é ainda maior, criando uma contradição: a de emitir gases de efeito estufa que certamente é mais nocivo às populações do que construir usinas com reservatórios.
Nesses termos, o dilema que a sociedade brasileira está enfrentando é a opção em mais reservatórios versus mais emissão de gases de efeito estufa. Vale assinalar que os novos reservatórios projetados pelo governo pretendem alagar menos quilômetros quadrados do que o desmatamento verificado na Floresta Amazônica em um ano (2010-2011). E as novas usinas hidrelétricas vão poder gerar por mais de 50 anos energia elétrica limpa, renovável e mais barata.
http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/desenvolvimento/brasil-matriz-eletrica-futuro-745136.shtml?func=1&pag=1&fnt=14px
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