domingo, 24 de maio de 2015

Aumento de impostos reduz qualidade do ajuste. O contingenciamento dos gastos é extenso, mas aconselha-se esperar para saber se o prometido de fato será cumprido. Enquanto isso, elevam-se tributos.

Editorial O Globo
O contingenciamento nas despesas orçadas para este ano, anunciado ontem pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, é extenso. Os R$ 69,3 bilhões bloqueados no Orçamento equivalem a 35% das chamadas despesas discricionárias da União — as que podem ser alteradas pelo administrador público. De fato, medida forte. Os números frios indicam ser possível chegar-se à meta de um superávit primário de 1,2% do PIB. Mas é preciso esperar para saber se promessas serão cumpridas.

O governo precisava mesmo acenar com algo desse calibre, diante da dificuldade política para aprovar a redução de despesas num Congresso autista que, ao contrário, aprova mais gastos. Não bastasse essa contingência política, paira sobre o ajuste a tendência atávica no país de, no momento do aperto de contas, privilegiar-se o aumento de impostos e o corte nos investimentos. Faz-se o ajuste em cima do contribuinte, já assoberbado sob pesada carga tributária, e prejudicando projetos de investimento público.

Sabe-se que a maior parte do Orçamento é composta por despesas garantidas por lei (pensões, salários de servidores) e engessadas por contingências políticas (gastos sociais). Mesmo assim sempre há margem para cortes num governo de 39 ministérios e com 22 mil cargos tidos de confiança, geralmente ocupados por apaniguados políticos.

Nelson Barbosa anunciou, ainda, metas de redução do custeio da máquina. Algo bem-vindo. O Ministério das Cidades é o mais afetado no bloqueio de verbas — R$ 17,2 bilhões. É um caso típico em que quanto mais forem cortadas despesas de custeio, melhor.

O cacoete de se tesourar investimentos também aparece neste contingenciamento: no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), foram bloqueados R$ 25,7 bilhões, ou 39,5% do que está programado para o ano. É preciso olhar com lupa quais os projetos afetados. Mas o Minha Casa Minha Vida foi preservado, algo sensato.

Apesar das altas cifras citadas na entrevista de Nelson Barbosa, o perigo de vingar a tentação do fechamento das contas por meio de mais impostos é real, continua presente.

Por exemplo, noticia-se o recuo do governo na medida provisória para tornar realista o abono salarial, condizente com a realidade fiscal do país, sendo compensado pelo aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos bancos de 15% para 20%.

O Planalto atende, assim, aos pedidos do PT e outros para que os “ricos” paguem pelo ajuste e não os “pobres”. Ingenuidade, pois os aumentos de impostos são transferidos para preços e tarifas. O povo paga sem saber.

De indiscutível, na entrevista de Barbosa, foi a afirmação de que, sem ajuste fiscal, não haverá crescimento. Nem, por tabela, gastos sociais que se sustentem. 

http://noblat.oglobo.globo.com/editoriais/noticia/2015/05/aumento-de-impostos-reduz-qualidade-do-ajuste.html

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