por Caio Ferraro
Maus foi o primeiro e único quadrinho a receber o prêmio Pulitzer, cobiçado prêmio oferecido a importantes realizações do jornalismo, literatura e música. Esqueçam a discussão sobre a real relevância do prêmio. O que realmente importou naquele momento foi a discussão que se abriu: Afinal de contas, pode uma HQ receber tal prêmio? Foi criada uma categoria special, pois não houve consenso se era uma obra de ficção ou biografia. Art Spiegelman relata a história do pai, Vladek, na batalha pela sobrevivência durante a II Guerra Mundial. Havia um exemplar da obra na biblioteca da escola e os meninos o disputaram por semanas, mas resolvi utilizar para esclarecer as questões de perspectiva histórica. Lá fui eu perguntar pra eles pela enésima vez: “QUEM ESCREVE A HISTÓRIA?”
Desta vez eu tinha tempo pra explicar…
O projeto “Uma aula a mais!” começou tradicionalmente com o livro didático e fui realizando com eles o exercício de analisar os pontos de vista, conforme as oportunidades surgiam. A curiosidade dos meninos era grande, o que abria um leque imenso de possibilidades. O livro didático “Nova História Crítica” de Mário Schmidt foi perfeito para desconstruir a ideia de História única que enfiamos goela abaixo nas salas de aula. Recolhido das escolas do Estado por apresentar um conteúdo com “erro conceitual, doutrinação ideológica e incoerência metodológica” (leia matéria do Estado de SP). Levei o livro para eles compararem com o livro didático deles, com uma abordagem mais clássica, e selecionei justamente o fim da guerra. Enquanto o livro didático apresenta o famoso Dia D, a ação conjunta das tropas dos EUA-Inglaterra nas prais da Normandia, como o momento de virada, o livro banido aponta a reviravolta na frente de batalha da URSS como a guinada do conflito, citando a derrota nazista em Stalingrado e na Batalha de Kursk (confronto de tanques que eu jamais ouvira falar), seguido da foto abaixo:
Soldado do Exército Vermelho finca a bandeira da URSS em Berlim.
“MAS PROFESSOR QUAL É O CERTO?”
E lá fomos nós explicar que o mundo é muito mais do uma visão dicotômica que estabelece um CERTO e um ERRADO. Somos tão doutrinados a crer nisso, que o processo se torna trabalhoso e complicado, afinal de contas Hitler é um bicho-papão (o inimigo comum) e os demais líderes anjos salvadores. Certo? E se a Alemanha houvesse vencido a guerra, qual seria o papel de Hitler na História?
Propaganda da Folha de SP
Depois de dedicar algum tempo para explicar a forte influência judaica no cinema de Hollywood, chamando a atenção para a infinidade de filmes sobre o Holocausto e o hiato histórico dos demais grupos perseguidos, como ciganos, homossexuais e negros, fomos trabalhar com Maus.
Maus serviu para humanizar a figura do judeu. Entender como Vladek, um judeu caricato, pode sobreviver aos campos de concentração, é uma viagem que fazemos na companhia de seu filho Art no decorrer da obra. É um sentimento compartilhado com o autor, que vai, gradualmente, entendendo as idiossincrasias do pai. Selecionamos estas páginas para explicar o funcionamento das câmaras de gás e depois debatemos sobre as experiências dos médicos nazistas e a polêmica não utilização dos resultados na medicina moderna. Parece complexo demais para crianças de 12 anos? Não é.
Matéria da Superinteressante sobre os experimentos: Doutores da Agonia
Maus é leitura obrigatória para todos aqueles que pretendem entender a guerra. Assim como Gen, demonstra que aqueles que sofrem os reais males dos conflitos é a população comum.
http://historiaequadrinhos.com.br/ii-guerra-mundial-uma-aula-a-mais-maus-art-spiegelman/
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